Quem de nós, brasileiros, não conhece váááárias pessoas que "cozinham pra fora"? Desde criança, até o dia de me mudar do Brasil, comprei comida de boleiras, doceiras, "salgadinheiras"… Recentemente vi no programa da Ana Maria Braga o tal Brownie do Luiz, um rapaz que está se sustentando na faculdade fazendo e vendendo brownies. E é sempre assim, a água bateu na bunda, o brasileiro sai nadando.
A minha sobrinha postiça começou a fazer doces pra ganhar um extra no primeiro ano de faculdade. O negócio foi dando tão certo que ela largou o curso que fazia e foi estudar pra ser chef. A especialidade dela são doces, e agora ela tem até marca registrada. Terminou o curso e já começou a fazer uma segunda faculdade, dessa vez em nutrição.
Minha tia, quando meu tio ficou desempregadao, fez quentinha. Compraram uma máquina usada de fechar aquelas quentinhas de alumínio, ela cozinhava, íam ela e meu tio entregar quentinhas. Ficou rica? Não, mas ganhou um belo troco que pagou muitas das contas naquela época.
Lembram-se do meu funcionário que a mulher está recebendo uitkering ( salário desabilidade )? Pois então, o médico da coluna liberou para trabalho parttime e o psiquiatra não só liberou, como até indicou que ela voltasse a trabalhar.
O meu funcionário diz que ela não pode mais trabalhar com o que ela estudou porque ela está muito velha. Ela tem 37 anos ( mais nova que eu ) e estudou "vitrinismo". Nunca tinha ouvido falar nisso antes, mas aqui o povo estuda pra enfeitar vitrine. Ele me diz que ela está muito velha porque nessa profissão você tem que se abaixar muito, tem que ser muito rápida (???). What-ever.
Aí ele pensou em abrir um negócio próprio, pesquisou cupcakes. Achei uma ótima idéia, afinal, investimento inicial é pequeno, você faz no conforto da sua casa, no seu próprio ritmo, mas ele diz que não vai dar certo porque tem 6 pessoas fazendo o mesmo na região e que a margem de lucro é pequena. Eu acho patacoada, porque sempre que compro um cupcake pago os olhos da cara e o que você usa pra fazer aquele bolinho? Uma forminha, um monte de recheio e um bolinho mequetrefe, o custo mesmo é baixo.
Achando que eu podia ajudar, dei vários exemplos da brasileirada que mora por aqui, tem quem faça salgadinho, tortas, quem venda carne, carne recheada, docinhos… Mas nada é interessante o suficiente, ou dá o lucro que ele espera.
Paciência.
Na semana passada ele estava visivelmente preocupado. Perguntei se ele queria conversar. Ele me contou que por causa da discussão com o órgão que paga o salário desabilidade, em teoria, a esposa ficou 2 meses em casa sem estar oficialmente desabilitada ( eram 4 meses, ele negociou 2 ). Durante todo esse tempo, mesmo estando em casa, a esposa mandou as crianças pra creche no periodo integral. Agora a creche quer 2 meses de mensalidade por filho de volta, e dá no total mais de € 5000. Ele falou até com um advogado e como ele já assinou o acordo dos 2 meses de desabilidade, ele reconheceu que por 2 meses a esposa não estava enferma, portanto não tinha direito ao subsidio da creche ( se um dos pais está em casa, o casal não tem direito a receber o subsídio da creche, que em teoria pode chegar a 70% ). Fiquei com pena, mas também não entendo porque a mulher ficou em casa e continuou mandando os filhos pra creche.
Segunda foi aniversário dele, ele trouxe várias tortas e bolos que a esposa fez. Achei uma ótima forma de propaganda, e todo mundo gostou dos quitutes. No mês que vem é meu aniversário, então sugeri pra ele que se a mulher dele topasse, eu compraria as tortas e bolos dela. Por 3 tortas de maçã e três bolos ingleses ( daqueles pequenos e sequinhos, retangulares, aqui chamam de coffe cake ) ofereci 100 euros, o que é o dobro que eu pagaria em 4 tortas da Multivlaai. Como meu aniversário é numa segunda ela poderia fazer no fim de semana. Como vocês já devem ter adivinhado, ela não quis, deu a desculpa que terão um compromisso naquele fim-de-semana.
De novo, paciência.
Minha avó paterna, a Vó Nilda, ficou viúva antes dos 30, com dois filhos de 10 e 5 anos pra cuidar. Meu avô, que se recusou a casar antes deles terem uma casa própria, deixou a casa e uma pensão pra ela, pensão brasileira, cês sabem né? Minha avó mandou o filho mais velho temporariamente morar na casa de uma tia, arregaçou as mangas e de tarde, quando meu pai estava em casa ( ele era o filho de 5 anos ) ela lavava roupas pra fora, e de manhã, enquanto meu pai estava na escola, ela entregava, a pé, as roupas que algumas clientes não podiam buscar. Ela fez isso por mais de 20 anos, lembro que quando eu era pequena ainda tinha gente que vinha procurá-la pra uma ou outra "emergência", e se o dinheiro fosse bom, ela ainda fazia um bico. Meu pai, antes de casar, assim como meu avô, construiu uma casa "nos fundos" da minha avó, e quando eu nasci, ganhando melhor, ele comprou nossa primeira casa, e minha avó alugou a casinha que meu pai fez. Nunca aceitou um tostão dos filhos. Viveu bem, tinha até uma poupancinha, cuja "caderneta" ela sempre mostrava pros netos, toda orgulhosa. Tinha dores fortes nas pernas, provavelmente resultado dos anos em pé no tanque ou passando roupa, ou carregando roupa pra clientes, mas criou os filhos, sobreviveu.
Não entendo, esse povo sobreviveu a uma guerra, ou melhor, a duas guerras mundiais. Já ouvi histórias de gente que comeu sopa de bulbo de tulipa pra sobreviver, e como pode essa geração ser assim tão… tão… acomodada?
Anyway, postão-surra. De novo. Sorry.